tanta tormenta, alegria

7 de mai. de 2011

Batuque na cozinha

- Estando atolado em livros e jornais e que tais a maior parte dos dias do que já é há tempos, com a idade, a maior parte da minha vida, me acontece muito pensar na utilidade ou não desse ajuntamento de tranqueiras a que nos entregamos.
Minha biblioteca, por exemplo, tão pequenininha, é duas ou três vezes maior que a do Montaigne, que devia ser uma das maiores bibliotecas particulares do tempo em que ele viveu, século 16.

E quem diz que eu vou precisar desses livros todos, ou que a posse (e a leitura, certo, sejamos justos comigo) desses livros todos, vai me ser útil ou benéfica?
Digo, temos tanta, mas tanta, informação, e quase nada do que produzimos a partir dela é digno de lembrança uma semana depois de lido, visto, ouvido ou cheirado.
Shakespeare devia ter menos livros do que tenho numa prateleira...
Sei, sei, o mundo é mais complexo, as sociedades modernas isso, aquilo e aquele outro e tal e coisa e coisa e tal.
Mas a sensação é que emburrecemos.

Isso de forma alguma me põe junto àqueles que condenam o excesso de informação como emburrecedor. Não, sempre acho que é melhor pecar por excesso que por falta. Nós é que parecemos ter nos esquecido como nos mover entre o melhor e o pior. 

Um bom exercício para quem acredita que ler indiscriminadamente é benéfico, seria passar um tempo vendendo livros num sebo. Nenhum gênero vende mais que livros espíritas. Tenho certeza que um devoto ou estudioso do espiritismo, e quase todos os devotos do espiritismo são estudiosos, lê muito mais que um professor de letras da USP ou da PUC.
Mas lêem o quê? Livros espíritas.
Se leitura, por si, tivesse algum valor educativo, as filas de médiuns sem emprego vendendo avons e naturas fariam disparar as estatísticas dos engarrafamentos em São Paulo.

Católicos não lêem nada.

- É constrangedor, mas não tem como eu fugir da confissão:
Desde criancinha eu sempre quis fazer um desses quadros com cotações de filmes e discos e livros, que vejo desde sempre em jornais e revistas. Agora, pois que aqui estou, proprietário único e mandatário absoluto deste poderoso baluarte da imprensa digital, hei de enfim entregar-me à satisfação deste meu pequeno prazer solitário.

Cotações
- - - Vade retro!
- - ruim
- passável
+ bom
++ ótimo
+++ Deus existe!

Filmes
A rede social -   Cisne negro - - -   O discurso do rei -   Bravura indômita (Coen Bros.) -   Garotas do abc -   Filme de amor - -   A mocidade de lincoln +   Um homem sério ++   Invictus +   Neste mundo e no outro -

Livros
Todo homem é minha caça (Millôr, Record) ++   Em algum lugar algum (Ferreira Gullar, Record) ++   Missa negra (John Gray, Record) +   The spectator volume 1 (Joseph Addison e Richard Steele, Projeto Gutemberg) +++   Sexo na cuca (Deborah Blum, Beca) +   Melhores crônicas de ignácio de loyola brandão (Global) - - -

Discos
The voice that is! (Johnny Hartman) +++   Variações goldberg com Glen Gould +++   Variações goldberg com Pierre Hantäi ++   Complete savoy recordings (Billy Eckstine) +++  

TV
Veronica mars ++

- Dia desses fui acordado pelo toque infernal, insistente, histérico, do telefone. Fechei os olhos e tentei não atender, como faço de hábito, mas o troço não parava. Capitulei.
Era uma senhora de certamente mui distinta progênie, querendo me vender frios e laticínios.

Penso muito no Schopenhauer, que reclamava do barulho das carroças na rua onde morava, e me pergunto em que buraco fomos nos meter...

- Tem quem não goste de cinema inglês. Eu, quando escuto ou leio algum bestinha, que quase sempre o são aqueles que se declaram adeptos dessa estranha forma de perversão do gosto, eu, dizia, quando trombo com um deles, reviro os olhos e respiro fundo e rezo, pedindo às Musas que iluminem as mentes obscuras.
Que o cinema inglês é uma das delícias restantes sob os escombros daquilo que um dia se chamou, com muita esperança e pouco senso, de arte do século 20, é um fato que só os críticos deveriam ignorar.
Mas se até mesmo um sujeito bacaninha que nem o civilizadíssimo José Lino Grünewald a certa altura dos anos 60 achou de acreditar que o cinema brasileiro era mais importante que o inglês, o que esperar dos mais tosquinhos?
Se até o Ivan Lessa já deixou escrito que cinema inglês não há não senhor, que esperar dos mais lerdinhos, aqueles que ainda acreditam nas vagas vogas da Nouvelle Vague?
Eu sei, e simplesmente sei e não peça que eu explique porque tenho preguiça, que o pior filme inglês é melhor que o melhor filme francês ou, credo, brasileiro. Os americanos e os japoneses podem olhar para eles de cima. Os italianos podem lhes falar sem corar nem baixar os olhos. Mas francês e sueco e alemão e russo? Delírio de crítico.

- O clichê diz que João Cabral jamais escreveu um verso além da conta, enquanto Drummond escrevia e publicava demais. Certo sobre Drummond, errado sobre Cabral. Ele tem livros inteiros que podem ser dispensados sem dó nem piedade.
Outros poetas houve, e há, no Brasil, mais criteriosos que ele. José Paulo Paes, Roberto Piva e Ferreira Gullar são alguns.
Que alguns poemas de Cabral valham quase toda a obra de Paes e Piva, é outra discussão, que talvez fosse divertida. Mas sei não, com o Gullar a briga é braba.

- Poucos jornalistas hoje mais modernos que Heine. Morreu em 1856.

Aliás, alguém lembrou de comemorar, este ano, os trezentos anos(!!!!!) do The Spectator de Addison e Steele?

Um comentário:

  1. Você é um perigo para a sua própria categoria. Se ela existe organizada em alguma associação ou sindicato já estaria "expurgado" faz tempo, hehehe.Então leitura não educa! Pelamordedeus diga isso em voz baixa para os pedagogos não ouvirem!
    Adorei as alfinetadas aos espiritas, gargalhei de doer a barriga. Mas depois refleti e pensei que o meu perfil de leitora talvez se encaixe... não dos espíritas mas dos leitores contumazes que não aprendem nada... Melhor dizendo, aqueles que esquecem imediatamente após a leitura. Não é uma tristeza que restem na mente só parcos resumos das coisas. Do tipo aqueles resumos bem pobrinhos pra fuvest...

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